Visão do Direito: PEC 66/2023 e a reconfiguração do regime de precatórios

“A PEC estabelece limites escalonados para o pagamento de precatórios com base no percentual da Receita Corrente Líquida (RCL), fixando o mínimo de 1% e o máximo de 5%”

A Proposta de Emenda à Constituição nº 66, de 2023 (PEC 66/2023), aprovada no Senado Federal e em vias de promulgação, institui uma nova disciplina constitucional para o pagamento de precatórios e para o parcelamento de dívidas previdenciárias dos entes subnacionais. Aprovada em dois turnos, a proposta promove alterações nos arts. 100 da Constituição Federal e no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), com reflexos diretos na gestão fiscal dos entes federativos.

A proposta teve origem na necessidade de reequilibrar os compromissos financeiros dos estados e municípios com credores judiciais, ao mesmo tempo em que busca garantir espaço fiscal para despesas essenciais. A PEC estabelece limites escalonados para o pagamento de precatórios com base no percentual da Receita Corrente Líquida (RCL), fixando o mínimo de 1% e o máximo de 5%. O Distrito Federal, cujo estoque representa aproximadamente 10% da RCL, enquadra-se na faixa de 1% — o que permite previsibilidade, mas exige planejamento rigoroso para evitar bloqueios judiciais.

Outro ponto de destaque é a modificação do conceito de precatório de natureza alimentícia. A redação proposta para o §1º do art. 100 da CF torna o rol taxativo, abarcando apenas salários, proventos, pensões, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou invalidez. Honorários advocatícios de sucumbência passam a ser incluídos expressamente, enquanto outros tipos de créditos ficam de fora, afetando diretamente a ordem cronológica de pagamento.

A PEC também antecipa de 2 de abril para 1º de fevereiro a data de corte para inclusão no orçamento do exercício seguinte (§5º do art. 100 da CF), medida que impacta a integração entre tribunais e procuradorias. No caso do DF, isso exigirá maior alinhamento entre o TJDFT, PGDF e os órgãos fazendários para assegurar a tempestiva expedição dos precatórios.

A atualização monetária e os juros também foram revistos. O índice de correção será o IPCA, com juros moratórios simples de 2% ao ano. Caso o somatório ultrapasse a taxa Selic, aplica-se essa como teto. A supressão dos juros compensatórios deve gerar economia para os cofres públicos, mas também impõe perdas financeiras a credores que aguardam há anos o cumprimento de decisões judiciais.

Outro dispositivo relevante é a permissão para acordos diretos, com deságio, para pagamento antecipado de precatórios. Os credores poderão aceitar uma redução parcial dos valores em troca de quitação em parcela única, até o fim do exercício seguinte. Para o DF, esse mecanismo continuará como estratégia útil para reduzir o estoque de precatórios e melhorar seus indicadores fiscais. Nesse aspecto, o novo texto constitucional não fixou limites para o pagamento com deságio.

A dedução automática do estoque com base nos valores já depositados em contas judiciais, conforme o §30 do art. 100, representa uma inovação operacional importante. Os recursos aportados passam a ser imediatamente descontados do passivo, independentemente do efetivo levantamento pelo credor, o que favorece a melhoria dos indicadores fiscais.

Entretanto, o texto aprovado não passou incólume às críticas. O Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec) apontou possíveis inconstitucionalidades, como a ausência de prazo máximo para quitação da dívida, o congelamento de valores depositados e o limite anual de pagamento. Segundo o colegiado, parte do regime aprovado pode ser objeto de judicialização futura no STF.

Idenilson Lima da Silva, Procurador do DF

Fonte: Correio Braziliense

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